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Tóquio aprova lei que censura animes e mangás

A Assembleia Metropolitana de Tóquio aprovou, no último dia 15, a Ata para Desenvolvimento Saudável dos Jovens de Tóquio (東京都青少年健全育成条例 Tōkyō-to shōnen kenzen kakusei), popularmente conhecida por “projeto de lei 156” (doravante “PL 156”) e que impõe restrições a animes, mangás e games quanto ao seu conteúdo, com o intuito de desencorajar a abordagem de certos temas considerados “nocivos” para crianças e adolescentes, como o sexo e a violência.
Com a aprovação do PL 156, as obras consideradas “ofensivas” aos jovens não poderão ser vendidas a menores de 18 anos. Além disso, a portaria também determinou que a indústria otaku passe a evitar produzir conteúdos que promovam o sexo de forma “injustificadamente glorificada ou exagerada”. O governo de Tóquio também passa a ter controle sobre os conteúdos que são considerados “perturbadores da ordem social”.
I”s: trama conta a história de amor entre Iori (foto) e IchitakaI”s: trama conta a história de amor entre Iori (foto) e Ichitaka. Sensualidade é constante no mangá

O projeto de lei

O PL 156 foi elaborado em março deste ano pelo governo Metropolitano de Tóquio. O objetivo era regulamentar o uso de imagens de crianças em histórias em quadrinhos ou desenho animado com forte apelo sexual. Ou seja, a ideia era classificar como conteúdo adulto toda a obra que tenha em seu enredo algum personagem que aparenta ser menor de idade, em situações que envolvam sexo abusivo, estupro ou incesto. Segundo o governo provinciano, estas obras “prejudicam a formação de conceito saudável sobre o tema”.
Algumas das propostas do PL 156:
  • Proibir conteúdos que exibem atos sexuais (excluindo imagens da vida real) ou a simulação destes que seriam ilegais na vida real ou entre parentes que legalmente não se poderiam casar;
  • Deve-se evitar a exibição de atos que glorificam e exageram a violência e sexualidade de forma desnecessária;
  • A lei aplica-se a qualquer personagem (independentemente da idade);
  • A lei vale para todos os conteúdos que sejam prejudiciais para o correto desenvolvimento da sexualidade dos jovens;
  • O governo metropolitano de Tóquio terá poder unilateral para banir qualquer conteúdo em que o ato sexual ou sua simulação seja considerado corruptivo da ordem social.
Como o PL passou por votação pela Assembleia Metropolitana e foi aprovada, agora se tornou lei. Entretanto, a lei só se restringe à Província de Tóquio. No Japão, existem 47 províncias, cada uma com um governador e um Assémbleia Metropolitana, onde são discutidas as leis provinciais. Como o PL 156 é provincial, ela só é válida para Tóquio.

Os efeitos e as contradições do PL 156

As consequências para o universo otaku são muitas. A primeira delas é quanto à locação de mangás. Todas as publicações passarão por um censura prévia que será feita por burocratas aposentados do governo japonês, os amakudari. Caso o mangá não seja considerado “saudável”, a sua venda para menores será proibida. O efeito disso será que muitas publicações poderão ser canceladas devido à falta de revistas ou canais em que podem ser exibidos. A maioria só poderia ser publicada em espaços destinadas a maiores de 18 anos, com uma visibilidade muito menor.

Highschool of the Dead: republicação está sob risco com a nova regulamentação O PL 156 possui, ainda, trechos muito vagos, que não deixam claro o que pode ou não ser publicado. Frases como “prejudiciais para o correto desenvolvimento da sexualidade” ou “atos sexuais que violam as normas sociais” são subjetivos, o que dá brecha a diversas intepretações. O receio é que várias obras com conteúdos mais picantes, mas não necessariamente destinado a adultos, tenham suas vendas proibidas a menores, especialmente adolescentes, o público-alvo principal. Isso causaria uma queda drástica nas vendas, colocando em xeque diversos animes e mangás. Além disso, editoras deixariam de investir em vários projetos com medo de os mesmos serem censurados.
Outro trecho contraditório da nova lei é o que diz que estão proibidos “conteúdos que exibem atos sexuais (excluindo imagens da vida real)”. Ou seja, o PL 156 está liberando filmes e seriados de TV para exibir conteúdos eróticos. Esta parte da lei é uma das mais criticadas, já que as restrições, com efeito, atingem somente mangás e animes. Autores e fãs acusam o governo de liberar o cinema e a TV da censura pois seria muito mais difícil aprovar o texto caso produções maiores também estivessem sujeitas à mesma, o que geraria uma repercussão muito maior.
As cláusulas de autorregulação de conteúdo das obras vão entrar em vigor a partir do dia 1 de abril, e as restrições à venda e locação serão efetivadas em 1 de julho de 2011.
Embora as novas regras não tenham efeito sobre títulos já publicados, há o receio de que algumas publicações a serem relançadas sofram as consequências da nova regulamentação. É o caso do mangá Highschool of the Dead (à esquerda), que seria relançado no primeiro semestre de 2011.
A nova regulamentação também ameça a realização da Tokyo International Anime Fair 2011, prevista para ser realizada em março. Muitas editoras declaram que irão boicotar o evento em protesto ao PL 156. O governador de Tóquio, Shintarō Ishihara, mostrou indiferença quanto ao boicote: “Quem se importa se (as editoras) não vêm? Elas virão no próximo ano mesmo”, diz.

Ishihara: governador de Tóquio contra otakus

O polêmico governador de Tóquio: Shintarō Ishihara Shintarō Ishihara (à direita), 78 anos, é o governador da Província de Tóquio desde 1999 pelo Partido Liberal Democrata, de centro-direita. O político foi um dos que apoiaram a lei que regulamenta mangás, animes e games. Em entrevista coletiva, ele reforçou seu apoio à nova lei e fez comentários que aumentaram ainda mais a indignação de otakus.
“Se a pessoa que possui esse gosto quiser ler ou desenhar este tipo de coisa e ficar excitado com isso, por mim tudo bem. Contudo, eu não acho que as sociedades orientais iriam tolerar isso por muito tempo. O Japão tornou-se muito desinibido. Mas, vocês sabem, esta coisa é anormal, não é?”, atacou Ishihara.
O governador de Tóquio também acusou fãs de animes e mangás com cunho sexual de serem geneticamente deformados. “Eu somente aprovei esta lei porque era sobre não expor estas coisas para crianças. Está claro que existem pervertidos neste mundo. Pessoas tristes com o DNA deformado”, declara.
Ishihara também já causou revolta em outros momentos ao declarar que homossexuais também são “defeitos genéticos” e de ter acusado a escolha do Rio de Janeiro para sediar as Olimpíadas de 2016 de ter ocorrido por conta de “razões políticas obscuras”.
Uma curiosidade que envolve o nome de Ishihara é que ele já escreveu vários romances que envolvem situações de estupro e sexo com menores, como é o caso de Taiyō no Kisetsu, de 1955, que chegou a dar origem a um filme, chamado Season of the Sun. O livro conta a história de um boxeador no ensino médio que começa uma relação sexual com uma aluna. A trama termina com a garota ficando grávida do boxeador e morrendo após um aborto clandestino.

Animes e mangás sob risco (lista não exaustiva)

Highschool of the Dead: A supracitada obra é considerada a candidata número 1 a ser afetada pelo PL 156. Criado pelos irmãos Daisuke e Shōji Satō e publicado desde 2006 na revista Dragon Age, o mangá conta a história de uma cidade infestada por uma “pandemia” que transforma seres humanos em zumbis à Eu Sou a Lenda. O mangá e a adaptação para a TV são carregados de cenas fortes exibindo sangue, vísceras, corpos mutilados e suicídios e regadas a bastante sexualidade, o que leva a incertezas quanto ao seu futuro depois do PL 156.

Seikon no Qwaser Seikon no Qwaser: Escrito por Hiroyuki Yoshino e ilustrado por Kenetsu Satō, o mangá mistura cenas de violência e sensualidade. Seres supernaturais denominados Qwaser têm poderes que controlam um elemento especifico da natureza. Para usá-lo, é necessário o consumo de “soma”, substância sagrada que pode ser obtida através do consumo de leite materno. No mangá e no anime são mostradas cenas em que os Qwasers obtêm o soma “direto da fonte”, ou seja, alimentando-se nos seios de moças virgens. O anime teve 24 episódios, enquanto que o mangá é publicado desde 2006 até hoje.

Gravitation EX Gravitation EX: O webmangá, cuja publicação está em pausa desde 2008, é a continuação direta de Gravitation, de tema yaoi. A série original, publicada entre 1996 e 2002, conta sobre a relação amorosa entre Shūichi Shindō, vocalista da banda Bad Luck, e Eiri Yuki, um famoso romancista. Yuki inicialmente faz duras críticas à Bad Luck, o que, aliado ao seu aspecto belo e invulgar, acaba despertando sentimentos em Shūichi, e ambos eventualmente se envolvem. Yuki, no entanto, esconde um passado conturbado, o que o faz manter certa distância do amor de Shūichi. A série ainda ganhou um OVA em 1999 com o subtítulo Lyrics of Love e uma adaptação para anime em 2000.
Sora no Otoshimono: O mangá é protagonizado por Tomoki Sakurai, um jovem pervertido que almeja ter uma vida pacata e tranquila, até que encontra Ikaros, uma Angeloid. A trama envolve os mais variados pedidos de Tomoki, em geral todos relacionados a tocar nos seios das meninas do colégio e outras coisas ainda mais pervertidas. O mangá, assim como o anime, ainda conta com personagens femininas eróticas, com curvas acentuadas e seios voluptuosos, além de nudez e de um dos encerramentos do anime possuir “calcinhas voadoras”. Sora no Otoshimono é de autoria de Sū Minazuki, é publicado na revista Kadokawa Shoten desde 2007 e o anime recentemente encerrou a sua segunda temporada, Sora no Otoshimono: Forte.

Junjō Romantica Junjō Romantica: Outro mangá yaoi, de Shungiku Nakamura e publicado desde 2002 na Kadokawa Shoten. Conta sobre três casais homossexuais cujos passados e trajetórias se encontram: o casal que dá nome ao título da obra, o estudante Misaki Takahashi e o escritor yaoi Akihiko Usami; o casal “Junjō Egoist”, Nowaki Kusama e Hiroki Kamijō (amigo de infância de Akihiko); e o casal “Junjō Terrorist”, Miyagi Yō (professor de literatura, colega de Hiroki) e Shinobu Takatsuki (ex-cunhado de Miyagi). Ganhou, em 2008, adaptação para anime, com 24 episódios e exibida na TV Hokkaidō.

Antecedentes

Capa de Harenchi Gakuen A luta contra mangás e animes que abordam estes temas não é recente. Desde o final da década de 1960, a Associação de Pais e Mestres do Japão já fazia críticas a algumas produções. Uma das obras criticadas foi Harenchi Gakuen (à direita), de Gō Nagai. Um dos primeiros hentais em mangá, foi uma das publicações da primeira edição da revista Shōnen Jump, uma das mais populares no Japão, e gerou polêmica: a narrativa se passava em uma escola onde algumas situações como meninos espiando meninas se trocando e as alunas levantando as suas saias para mostrarem suas roupas íntimas são corriqueiras. O mangá, publicado até 1972, gerou revolta por parte de muitos pais, que chegaram até a queimá-lo em público.
“Se (naquela época) houvesse esta regulamentação, o Harenchi Gakuen não teria sido publicado”, apontou Nagai, em entrevista na sede do governo do Tóquio.
Uma pesquisa de 2007 encomendada pelo governo do Japão revelou que 90% das quase 20 mil pessoas consultadas eram favoráreis a uma regulamentação sobre o uso de imagens de personagens com aparência de menores de idade em histórias em quadrinhos e ilustrações.
Em 2008, a campanha “Vamos acabar com a pornografia infantil” colheu mais de 114 mil assinaturas cobrando do governo e da Dieta (o equivalente ao Congresso Nacional Brasileiro) regulamentação sobre a abordagem de sexo envolvendo crianças na mídia em geral. A campanha também pedia a criminalização da posse de materiais com tais conteúdos, como animes e mangá

Fonte do texto: Radio Blast!
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